Miyano Hime (Sensei)

Hime sempre foi muito bonita. Era popular quando mais nova, e adorava a vida na cidade. Mas seus pais tiveram que viajar por trabalho, e passariam cerca de três anos ou mais fora. Ela então, a contragosto, foi levada a casa da tia, que morava no interior.
Depois de não muito tempo na casa da tia, quando tinha seus 16 anos, ela logo se apaixonou por um amigo, ruivo. Ela sabia do que ele gostava, afinal, era seu amigo! E determinada, começou a investir nas coisas que ele gostava, para tentar ser notada: coisas diferentes, geografia, animes e mangás. A primeira mudança que fez foi pintar seus longos cabelos loiros na cor rosa. Depois, começou a comprar diversas revistas de mangás, e em não muito tempo, se tornou uma otome/otaku quase que completa. Antes mesmo de se declarar para ele, o próprio ruivo veio falar com ela sobre isso, pedindo-a em namoro. Ela não recusou.
Entretanto, com o tempo, refletia e chegava em conslusões não amigáveis. Hime sabia que não estava sendo completamente ela com o ruivo. Sabia que ele havia se apaixonado por um lado dela que não existia. Mas gostava tanto dele, que não quis arriscar perdê-lo. Continuou com a farsa.
No aniversário de dois anos de namoro, ela começou a não suportar a situação. Em uma noite, mesmo sendo tarde, ligou para o ruivo, e pediu para que se encontrassem em uma praça, porque eles precisavam conversar. Ele, relutante, aceitou.
Hime estava perto do seu destino, quando algo aconteceu. Passando ao lado de um beco, algumas mãos puxaram ela no escuro, escondendo-a. Entretanto, o local era visivel para quem estava na praça.
No beco, Hime estava em perigo. Ela não conseguia ver os rostos das pessoas, mas conseguiu definir que eram, no mínimo, dois homens. Estes começaram a desabotoar a blusa de Hime, que não estava gostando daquilo. Gritou pedindo socorro, mas nada acontecia. Se assustava ainda mais com o barulho de zíperes se abrindo. Ficou com medo, tentou fugir. Prenderam ela.
E logo, apareceu mais outro alguém. Um outro homem chegara arfante, e com discrição, infiltrou-se com os caras. Estava escuro, mas Hime conseguiu identificar o perfume do ruivo. Este tratou logo de desamarrar Hime, e tentar guia-la para a porta. Mas não foi discreto o suficiente. Os homens notaram, e sacaram um revolvér. 'Hime, fuja!', gritou. Conseguiu confirmar nesta hora: Era seu ruivo. Desesperada, saiu correndo sem pensar duas vezes. Arrumava a roupa, só queria sair dali.
Então... um tiro. Hime ficou paralisada. Ele estaria... morto? Não, não podia ser. Ela não queria acreditar. Não seu ruivo, quem amava. Não podia morrer. Não podia deixar ela sozinha. Não, não, não. Ela... precisava dele. Precisava do amor, do consolo dele. De sua calidez, de sua animação. Mas... só podia, ele era péssimo em corrida, esquiva. Lágrimas começaram a escorrer. Tentou recolhê-las e reprimi-las. Precisava ser forte por ela e por ele. Mas não, não conseguia. Não dava pra parar, as lágrimas agiam por conta própria. Precisava ver com seus próprios olhos. Confirmar. Com muito medo, passos pesados, voltou à espreita, para o beco. Agora estava vazio. Avançava no escuro, para ver se achava algo. Pisava lentamente. Então, um odor horrível de sangue subira ao ar. Sangue!
Quase que tropeçou no que parecia um braço. Mas não conseguia ver o que era. No seu bolso, retirou seu celular, e o usou como lanterna. Sim, aquilo era um braço humano. Sentiu calafrios, arrepiou-se toda. Recuou. Queria mesmo ver aquilo? O odor só aumentava.
Mas ela estava convicta. Sim, sim, sim, ela precisava ver o que lá descansava.
Mais vermelho.
Vermelho em seu corpo, sangue apodrecendo. Em suas mãos, provavelmente tentando estancar o sangue, inutilmente. Vermelho no chão, sangue manchando o chão com sofrimento. E... o vermelho em seus cabelos. Era seu ruivo. As lágrimas agora não paravam de maneira alguma. Soltou o celular bruscamente.
Começou a acariciar os ombros do ruivo, como se aquilo fosse melhorar a situação. Gelo. Frio. Não sentia mais calidez, não se sentia aquecida com seu toque. Não, não. Era duro de acreditar. Levou a mão lentamente mais abaixo, queria ter a certeza. Havia um buraco. Um buraco, ensanguentado. Era exatamente ali, no seu ombro direito, que ele fora atingido. Se o atirador quisesse o coração, ele tinha uma péssima mira. Tentou alcançar onde ficaria tal. O coração parecia ausente. Sem movimentos, sem tremulação. Parado. Não sabia o que sentia dali por diante. Se era raiva de si mesma, se era tristeza. Só sabia que era dor. Dor simplesmente. Pegou o ruivo em seus braços, e o abraçou. Sussurrava, quase sem voz, seu nome. Mas sabia que dali por diante, mesmo se gritasse, ele nunca mais a ouviria.
Demorou-se por muito tempo, e quando estava por ir embora, ligou para a polícia anonimamente. Deviam ser mais de 4 horas da manhã. Ainda chorava, triste. Mas estava mais calma.
Quase fora molestada, estuprada, e seu namorado morreu. Mas, o que ela não conseguiu parar de pensar, foi no ruivo. Para ele, morrera tentando proteger quem amava. Para ela, ele morreu por uma farsa, por uma ilusão, por alguém que não existe totalmente. Uma morte em vão. Pensar que era a culpada, só a deixava pior, afinal, perder o namorado já é algo ruim, sobretudo se é na sua frente, por sua causa. Mas achava realista seu modo de pensar.
Naquele momento, desejou poder voltar no tempo, mais do que tudo. Não aceitar o namoro. Não enganar ele, e a ela mesmo, com uma personalidade que não existe. Ela não ficaria com ele, e ele não ficaria com uma ilusão. Ele não morreria.
Dia seguinte, ainda muito mal, notou ovos em sua cama, achou estranho, e os ignorou. Em poucos dias, nasceu Shirome. Shirome dizia para ela que é inútil tentar mudar o passado, mas que é possível evitar que isso aconteça de novo no futuro. Desde então, Shirome sempre está ao seu lado, lembrando Hime do que ela realmente é.
Hime jogara seus mangás fora, tirara o rosa de seus cabelos. Não muito depois, seus pais voltaram, e com isso, voltou também para a cidade. Assim que teve a oportunidade, tentou seguir a carreira que seu ruivo queria tanto seguir: algo relacionado com geografia. Ela decidiu lecionar.

Depois de tudo o que aconteceu, resultou numa mudança pesada em Hime. Antes animada, agora fria e séria, entre outros. Talvez, isso não era totalmente inevitável.